quarta-feira, 27 de maio de 2009

Parabólica

Um pacto de ternura com o Recife
* Cida Pedrosa
É muito comum os poetas cantarem a sua aldeia. Parece-me que essa territorialização do fazer poético está ligada a esse retorno atávico a tribo, ao sentimento de pertença e à afirmação da identidade. Sem ter dados estatísticos e recorrendo à lei do achismo, tão próprio das nossas plagas, ouso dizer que Recife é uma das aldeias mais cantadas desse País continental. Por que será? É muito forte o sentimento recifense, mais que isso: há um culto à recificidade. Posso enumerar aos montes poetas que escreveram vários poemas para Recife ou que dedicaram sua poética à cidade. Bandeira e sua Pasárgada, Pena Filho e o Savoy, Austro Costa e Cabral e o Rio Capibaribe, Erickson Luna e Santo Amaro da Salinas, Francisco Espinhara e a Rua 7 e outros tantos mais, inclusive eu. Basta dizer que a edição do livro Poesia Viva do Recife, coletânea temática sobre a cidade com a participação de mais de cem poetas e coordenada por Juareiz Correya, se encontra na sua terceira edição. Por que será? Não serei eu a responder a essa pergunta, na verdade vou colocar mais palavras na conversa e na roda, outro poeta picado pela recificidade que é o Robson Sampaio.

Vou começar citando o poeta: O Recife não é uma aldeia! - O Recife é um estado de ser... A radicalidade com que o poeta exprime a sua relação com a cidade é tão grande que os torna um único ser: poeta e cidade se misturam e se confundem. É sob essa perspectiva que quero falar do livro Eu Sou Capibaribe - Poemas. Um livro cujos poemas invariavelmente gravitam em torno do Recife, mesmo quando confessional e íntimo, vejamos: Recife (Noturno) - Só gosto de ti à noite,/ quando os abstêmios dormem/ e os boêmios saem às ruas/ em busca do nada./ Só gosto de ti à noite,/ quando batem lembranças/ de amor e de sonhos perdidos/ no tempo./ Só gosto de ti à noite,/ quando me debruço sobre/ o Rio Capibaribe e,/ assim, consigo ver a minha alma/ e a chorar a dor do mundo./ Só gosto de ti à noite,/ quando pertences por inteiro/ aos boêmios, vagabundos e poetas.

É nessa atmosfera de cidade noturna, de mazelas e misérias, de boêmios e putas, de poetas e bares, de saudade e carnaval de frevo e rio que o livro se faz. Às vezes parece letra de música como em carnaval: Recife,/ não mais te encontro/ e sinto uma saudade/danada... Ou no mesmo tom: Saudades... Mais saudades do Azul/ e do Recife-poético./Saudades recifenses,/ sempre azuladas... E continua em: É o canto do Galo,/ é o som da Madrugada,/ É o canto do Galo/ do Galo da Madrugada. O próprio poeta declara a sua forma de fazer poesia no poema Ao Bar e Restaurante 75: Para, no tilintar da sinfonia dos copos,/ compor saudosos e eternos/ poemas-canção...

E assim o poeta reafirma sua identidade e continua cantando sua aldeia, como já havia feito no seu livro de 2007, O Recife & Outros Poemas, afinal, feliz de quem tece essa rede urbana de amor e costura um pacto de ternura com a sua cidade. E para fechar, já que não sei escrever prefácios, faço um plágio do poeta Robson Sampaio: Amor não se mede/ Amor não se compara/ Amor é amor.
* Poetisa e editora do site www.interpoetica.com.br

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